Fendas orofaciais e risco de cancro gástrico: uma questão de migração mediada por caderina-E

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Fendas orofaciais e risco de cancro gástrico: uma questão de migração mediada por caderina-E

Quarta, 18.09.2024

O grupo Epithelial Interactions in Cancer do i3S coordenou uma equipa multidisciplinar para estudar a forma como as alterações germinativas da caderina-E desencadeiam diferentes manifestações clínicas. O grupo ficou intrigado com o facto da perda de função da caderina-E poder causar cancro gástrico difuso hereditário (HDGC) e malformações congénitas, como as fendas orofaciais (OFC).

Joana Figueiredo reuniu uma equipa de investigadores do i3S e da Universidade de Coimbra para desvendar os mecanismos responsáveis pelo fecho anormal do lábio/palato, a malformação congénita mais prevalente em todo o mundo, com uma incidência de 1 em cada 700 recém-nascidos. Os indivíduos afectados necessitam de cuidados abrangentes, uma vez que apresentam dificuldades na alimentação, na fala, na audição, assim como problemas dentários e de saúde mental.

Nessa altura, Joana Pereira, uma talentosa aluna de doutoramento, integrou o projeto e desenvolveu uma estratégia que englobou modelos in vivo e in vitro de mutantes da caderina-E associados a OFC e a HDGC. Foi desenvolvida uma abordagem em Drosophila, em colaboração com o laboratório de Eurico Morais-de-Sá, que demonstrou que as variantes identificadas no contexto OFC conferiam às células uma configuração alongada e ergodinâmica, associada a uma menor resistência e a um maior movimento no microambiente. Através de ensaios de migração e microscopia time-lapse, a equipa confirmou uma capacidade invulgar dos mutantes OFC de migrarem mais rapidamente e com uma direccionalidade anormal, quando comparados com células que expressam variantes HDGC. De facto, embora os OFC se caracterizem por uma falha da fusão das proeminências faciais embrionárias, os seus dados sugerem que isto pode não ser o resultado de uma migração celular atrasada. Em vez disso, propõem que um desempenho excessivo na motilidade impede o movimento coordenado das camadas de células epiteliais, formando projecções semelhantes a dedos e bordos de migração irregulares, resultando em estruturas faciais anómalas. Isto é apoiado por um fenótipo de vantagem mecânica conferido por uma maior adesão a matrizes extracelulares.

O grupo colocou então a hipótese da plasticidade das células OFC estar relacionada com a ativação de um perfil de expressão específico. Após a implementação de uma estragégia de sequenciação do RNA, verificou-se que o genótipo OFC produzia uma assinatura molecular distinta daquela produzida pelo genótipo HDGC, expondo o REG1A como um possível regulador deste comportamento.

Com este trabalho, a equipa forneceu provas de que as variantes de caderina-E associadas a OFC activam vias de sinalização aberrantes que induzem rearranjos dinâmicos nas células, no sentido de uma maior adaptabilidade ao microambiente. Esta proficiência resulta na formação e movimento anormais dos tecidos, que podem estar no centro das malformações orofaciais. No futuro, o aconselhamento genético dos portadores de variantes de caderina-E poderá beneficiar de protocolos de classificação de variantes que incluam a avaliação das características de migração através de ensaios in vitro. Isto será crucial para identificar as pessoas em risco de cancro gástrico e as que poderão ter um recém-nascido afetado por anomalias congénitas.

Em última análise, este trabalho ilustra a forma como uma rede de colaboração com conhecimentos distintos sinergizou para resolver um problema de investigação desafiante, destacando o poder de linhas celulares mutantes específicas e de modelos de mosca na descoberta de mecanismos celulares envolvidos na complexidade das doenças.

 

Autores e Afiliações:

Joana Pereira 1 2 3, Soraia Melo 1 2, Rui M Ferreira 1 2, Patrícia Carneiro 1 2, Vítor Yang 1 4 5, André F Maia 1 4, João Carvalho 6, Ceu Figueiredo 1 2 3, José Carlos Machado 1 2 3, Eurico Morais-de-Sá 1 4, Raquel Seruca 1 2 3, Joana Figueiredo 7 8 9

1 i3S - Instituto de Investigação e Inovação em Saúde, Universidade Do Porto, Rua Alfredo Allen, 208, Porto, 4200-135, Portugal.

2 IPATIMUP - Institute of Molecular Pathology and Immunology of Porto University, Porto, Portugal.

3 Faculty of Medicine, University of Porto, Porto, Portugal.

4 IBMC - Institute for Molecular and Cell Biology, University of Porto, Porto, Portugal.

5 ICBAS - Institute of Biomedical Sciences Abel Salazar, University of Porto, Porto, Portugal.

6 CFisUC, Department of Physics, University of Coimbra, Coimbra, Portugal.

7 i3S - Instituto de Investigação e Inovação em Saúde, Universidade Do Porto, Rua Alfredo Allen, 208, Porto, 4200-135, Portugal. 

8 IPATIMUP - Institute of Molecular Pathology and Immunology of Porto University, Porto, Portugal. 

9 Faculty of Medicine, University of Porto, Porto, Portugal.

 

Abstract:

Germline mutations of E-cadherin contribute to hereditary diffuse gastric cancer (HDGC) and congenital malformations, such as oral facial clefts (OFC). However, the molecular mechanisms through which E-cadherin loss-of-function triggers distinct clinical outcomes remain unknown. We postulate that E-cadherin-mediated disorders result from abnormal interactions with the extracellular matrix and consequent aberrant intracellular signalling, affecting the coordination of cell migration.

Herein, we developed in vivo and in vitro models of E-cadherin mutants associated with either OFC or HDGC. Using a Drosophila approach, we addressed the impact of the different variants in cell morphology and migration ability. By combining gap closure migration assays and time-lapse microscopy, we further investigated the migration pattern of cells expressing OFC or HDGC variants. The adhesion profile of the variants was evaluated using high-throughput ECM arrays, whereas RNA sequencing technology was explored for identification of genes involved in aberrant cell motility.

We have demonstrated that cells expressing OFC variants exhibit an excessive motility performance and irregular leading edges, which prevent the coordinated movement of the epithelial monolayer. Importantly, we found that OFC variants promote cell adhesion to a wider variety of extracellular matrices than HDGC variants, suggesting higher plasticity in response to different microenvironments. We unveiled a distinct transcriptomic profile in the OFC setting and pinpointed REG1A as a putative regulator of this outcome. Consistent with this, specific RNAi-mediated inhibition of REG1A shifted the migration pattern of OFC expressing cells, leading to slower wound closure with coordinated leading edges.

In conclusion, we provide evidence that E-cadherin variants associated with OFC activate aberrant signalling pathways that support dynamic rearrangements of cells towards improved adaptability to the microenvironment. This proficiency results in abnormal tissue shaping and movement, possibly underlying the development of orofacial malformations.

 

Revista: Cell Communication and Signaling

 

Link: https://biosignaling.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12964-024-01532-x